Martha Beck
O Globo - 23/04/2012
Nova estrutura prevê contratação de 200 servidores, mas concurso
não saiu
BRASÍLIA - O super-Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade) - que unifica toda a análise e o julgamento de fusões de
empresas no país - está sob ameaça de começar a funcionar com uma estrutura
precária. Os técnicos correm contra o tempo para deixar tudo pronto até o
início dos trabalhos no fim de maio, mas um dos problemas mais importantes não
será resolvido a tempo: a falta de pessoal. A lei que criou a nova estrutura
prevê que são necessários 200 novos servidores para a análise de atos de
concentração e de condutas como formação de cartel. No entanto, ainda não há
qualquer sinal de concurso público que atenda a toda essa demanda.
Parte da demora se deve aos cortes de R$ 55 bilhões no
Orçamento deste ano. A falta de estrutura pode comprometer o trabalho do órgão,
especialmente porque a nova lei faz uma mudança radical na forma como as fusões
são avaliadas no Brasil. A análise e o julgamento desse tipo de operação
passarão a ser feitos previamente.
Hoje, a análise acontece só depois que o negócio é fechado
entre as empresas. Com a mudança no procedimento, o super-Cade terá 240 dias
(prorrogáveis por mais 90) para tomar uma decisão. Caso não haja uma definição
dentro do prazo fixado, o ato de concentração será aprovado automaticamente.
Para minimizar o risco de uma fusão ser aprovada
sumariamente, o novo Cade também contará com uma regra pela qual o prazo de
análise só começará a contar a partir do momento em que os conselheiros derem o
sinal verde. E isso só vai ocorrer depois que as empresas interessadas
apresentarem uma extensa documentação.
- Os formulários precisam estar preenchidos de forma
completa. A triagem feita para que uma operação comece a ser avaliada pelo
sistema de defesa da concorrência será rigorosa - afirmou um técnico da área.
Para especialista,
quadro é preocupante
Hoje, como as operações são avaliadas posteriormente, em
muitos casos as empresas preenchem os formulários exigidos pelo governo de
forma incompleta. A estratégia é fazer com que haja demora no julgamento do
processo no Cade, de forma que o negócio se consolide, e fique mais difícil
para as autoridades rejeitar o ato de concentração.
Diante da urgência e do tamanho do problema, os técnicos do
governo ligados à área de concorrência conseguiram negociar com o Ministério do
Planejamento um acordo para que seja publicada uma portaria com a liberação de
50 vagas para a nova estrutura. Esse total vai se somar aos 50 servidores
herdados do atual Cade e do Departamento de Proteção e Defesa Econômica (DPDE),
ligado à Secretaria de Direito Econômico (SDE).
- Os 50 novos servidores vão trazer uma ajuda importante,
mas não será suficiente - admitiu um técnico.
Segundo o advogado especialista em direito econômico, José
Del Chiaro o quadro é preocupante, mas não calamitoso. Isso porque foram
fixados também novos critérios para que fusões sejam avaliadas pelo conselho.
Com a nova lei, só serão analisadas operações em que uma
empresa tenha faturamento anual acima de R$ 400 milhões e a outra, acima de R$
30 milhões no Brasil. Antes, a obrigação era submeter casos em que uma das empresas
tivesse faturamento no país superior a R$ 400 milhões ou participação de
mercado maior ou igual a 20%.
- O novo critério vai aliviar o trabalho de análise dos atos
de concentração. O volume de serviços do Cade vai cair. Mesmo assim, o
contingente ainda não é o ideal, embora não estejamos num quadro de calamidade
- disse Del Chiaro.