O Estado de S. Paulo
- 09/04/2012
Ao julgar um recurso administrativo e dois pedidos de
providência enviados por serventuários do Tribunal Regional do Trabalho (TRT)
da 8.ª Região, que abrange os Estados do Pará e do Amapá, o Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) abriu um importante precedente para a solução do problema da
suspensão de serviços e atividades essenciais causado por greves do
funcionalismo público.
No ano passado, os serventuários do TRT da 8.ª Região
promoveram uma greve de 46 dias e a Corte determinou o desconto dos dias não trabalhados.
No recurso enviado ao CNJ, os funcionários reivindicaram o direito de compensar
os dias parados, por meio de horas extras, e pediram ao órgão responsável pelo
controle do Judiciário que intercedesse nesse sentido junto à presidência do
TRT. Por 12 votos contra 3, o CNJ não só considerou legal o corte do ponto dos
grevistas, como ainda decidiu expedir um enunciado administrativo para orientar
todos os demais tribunais.
De autoria do conselheiro Gilberto Martins, o texto do
enunciado será submetido à votação na próxima terça-feira, mas seu conteúdo já
foi definido, levando em conta o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal
Federal sobre a matéria. Há alguns anos, a Corte decidiu que, enquanto o
Congresso não aprovar uma lei complementar que regulamente a greve no poder
público, como prevê o inciso VII do artigo 37 da Constituição, prevalecerá a
Lei n.º 7.783. Editada em 1989, essa lei disciplina a greve na iniciativa
privada e estabelece limites para a suspensão do trabalho nos setores estratégicos
- como hospitais, aeroportos, telecomunicações, transporte coletivo,
recolhimento de lixo e distribuição de alimentos, medicamentos, gás, energia
elétrica e combustíveis. Se esses limites forem desrespeitados, a Lei n.º 7.783
permite aos empregadores demitir os grevistas.
Além disso, o enunciado administrativo do CNJ estabelece que
o corte de ponto e o não pagamento dos dias parados estão entre as punições
aplicáveis - segundo a discricionariedade dos gestores públicos - a quem
desrespeitar os limites fixados pela Lei n.º 7.783 para a suspensão de serviços
e atividades essenciais. "Ninguém está cerceando o direito de greve.
Todavia, as paralisações impõem um ônus aos que aderem", diz o conselheiro
Gilberto Martins. Para ele, o desconto dos dias parados não é uma punição aos
servidores públicos, mas o desdobramento natural da greve. "Caso
contrário, a sociedade seria prejudicada, pois, além de ficar sem o serviço
público durante o período da paralisação, ainda teria de pagar por isso",
explica o conselheiro.
A decisão do CNJ coincide com a retomada, no Congresso, do
debate sobre a regulamentação do direito de greve do funcionalismo público.
Alegando que a edição da lei complementar prevista pela Constituição está
atrasada 23 anos, há quatro meses o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) apresentou
o Projeto de Lei n.º 710/11, regulamentando a greve no setor público.
O projeto abrange servidores da administração pública
direta, autárquica e fundacional dos Três Poderes e em todos os níveis - União,
Estados e municípios. Entre outras medidas prescritas pelo projeto está a
obrigação de que, nas atividades consideradas essenciais, 80% dos servidores
permaneçam trabalhando. Nas demais atividades, o projeto determina que 50% dos
servidores continuem exercendo suas funções. Se as exigências não forem
cumpridas, a greve será considerada ilegal e os grevistas sofrerão processo
administrativo. O projeto também prevê medidas semelhantes às impostas pela Lei
n.º 7.783 aos trabalhadores da iniciativa privada, como, por exemplo, a
obrigação de informar ao público as reivindicações dos grevistas e de exigir
deles medidas para evitar a deterioração de bens, máquinas e equipamentos.
O enunciado administrativo que o CNJ expedirá na próxima
terça-feira e o Projeto de Lei n.º 710/11, que tramita na Comissão de
Constituição e Justiça do Senado, têm o mesmo objetivo: acabar com a
irresponsabilidade dos líderes sindicais do funcionalismo, que não hesitam em
suspender atividades essenciais e em converter a população em refém de reivindicações
muitas vezes absurdas e descabidas.