Adriana Caitano
Correio Braziliense
- 25/05/2012
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), do Senado e da
Câmara de divulgar o salário de todos os servidores, incluindo ministros e
parlamentares, gerou questionamentos no âmbito jurídico por parte de entidades
que representam os trabalhadores. Os sindicatos alegam que, além de representar
risco aos funcionários, a publicidade dos contracheques com o nome de cada
servidor fere o direito à intimidade, previsto na Constituição Federal. A forma
como esses dados serão divulgados ainda não está clara, e especialistas se
dividem quanto à legalidade da regra.
O STF foi o primeiro a anunciar que tornaria públicos os
nomes dos funcionários com as devidas remunerações, incluindo benefícios
extras. O entendimento dos ministros segue decisão tomada por Gilmar Mendes em
2009, quando ele considerou regular a publicidade dos salários de servidores do
município de São Paulo. O mérito da questão, no entanto, ainda será analisado
em plenário, e a decisão valerá para todo o país.
Enquanto o recurso não é julgado, porém, o caso divide
opiniões. Os presidentes da Câmara e do Senado disseram que vão seguir o ato
normativo a ser publicado pelo Ministério do Planejamento para regulamentar e
esclarecer exatamente como os órgãos do Poder Executivo vão tornar acessíveis
as remunerações individuais dos servidores.
O professor de direito constitucional da Universidade de
Brasília (UnB) Paulo Blair defende que essa divulgação contraria um princípio
constitucional: "Os servidores públicos são cidadãos como todos os outros
e também têm direito à intimidade e à vida privada, previstos na
Constituição", justifica. Para Blair, a melhor saída seria fortalecer os
órgãos de controle e fiscalização, que podem observar os possíveis abusos no
pagamento de salários.
O Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo e do
Tribunal de Contas (Sindilegis) já se manifestou contrário à divulgação nome a
nome, e diz preparar uma "batalha jurídica" para derrubar o ato. O
presidente da entidade, Nilton Paixão, também alega questão de segurança pessoal:
"Divulgar o nome do servidor com a respectiva remuneração pode expor toda
a família a um risco desnecessário".
Já o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
Ophir Cavalcante, ressalta que "a insegurança no Brasil é um problema
social grave que independe de salários altos ou baixos". Ophir acrescenta
que o interesse coletivo deve superar o individual. "Quem paga esses
salários é o povo, e o patrão tem o direito de saber o que está pagando",
afirma.
Presidente da ONG Transparência Brasil, Cláudio Abramo
refuta o argumento da privacidade. "Não é interesse público saber o
salário de um trabalhador privado, mas, no caso do servidor público, quem
pagamos somos nós", comenta. Da mesma forma, o professor de direito
administrativo e público da UnB Márcio Pestana acredita que a liberação dos
salários e dos nomes dos servidores privilegia o princípio da privacidade,
também descrito na Constituição. "A palavra de ordem do século 21 é a
transparência, e ela deve se sobrepor ao interesse individual", destaca.
"No instante em que um servidor prestou concurso, ele assumiu a ciência de
que faria parte de uma entidade pública, que deve ser transparente nos atos que
comete".
Conflito
Tanto a defesa quanto os ataques à divulgação do nome e do
salário dos servidores se baseiam em princípios da Constituição. O argumento
contrário à medida segue o artigo 5°, o qual indica que "são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas". Já a alegação
de quem defende o acesso aos dados completos recorre ao artigo 37 da Carta
Magna: "A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes
obedecerá aos princípios de legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da
publicidade e da eficiência".