O Estado de S. Paulo
- 01/02/2014
As graves e notórias deficiências dos serviços de
fiscalização, em todos os níveis da administração pública, não podiam
evidentemente poupar as áreas federais de conservação ambiental e as terras
indígenas. Tanto a natureza dessas áreas como a sua enorme extensão - nada
menos que 1,8 milhão de quilômetros quadrados - não deixam dúvida quanto à
importância do problema. Para fiscalizar o cumprimento das leis destinadas a
proteger o ambiente e as terras indígenas, não existem mais do que 3.200
agentes, o que quer dizer que a cada um deles cabe a responsabilidade de cuidar
de 579 km². Uma tarefa impossível de ser realizada a contento.
Esses servidores trabalham no Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente (Ibama), Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) e Fundação
Nacional do Índio (Funai), que são os três principais órgãos encarregados da
vigilância e da proteção daquelas reservas. A precariedade dos meios para
executar essa tarefa fica ainda mais evidente quando se recorda que o Ibama
deve cuidar também da observância do Código Florestal em propriedades privadas,
agir contra a pesca ilegal e combater os garimpos clandestinos.
Diante disso, um dos diretores da Fundação SOS Mata
Atlântica, Mário Mantovani, não hesitou em afirmar ao jornal O Globo que a
fiscalização, nesse setor, é uma farsa, porque, por falta de meios para
combater os verdadeiros responsáveis pela degradação ambiental, o poder público
se volta contra os pequenos predadores: "Pega-se, por exemplo, uma família
que extrai palmitos para comer, mas não a rede de corrupção e crime que obriga
a família a pegar o palmito. Pega-se o sujeito que faz o carvão de maneira
irregular, mas não as empresas que o compram".
Não surpreende que, principalmente em consequência desse
comportamento, a situação tanto das áreas de proteção ambiental como das
reservas indígenas venha se deteriorando. Na Mata Atlântica, a derrubada de
árvores no ano passado - a maior parte destinada à produção de carvão - só foi
superada pela de 2009. Com isso, a esperança de uma melhora da sua preservação
sofreu um abalo. Algo semelhante ocorre na Amazônia, onde o desmatamento, para
dar espaço às atividades agropecuárias, voltou a crescer depois de quatro anos
em queda. Quanto às reservas indígenas, que ocupam 13,3% das terras do País, os
conflitos entre índios, posseiros e madeireiros continuam a preocupar as
autoridades e a manter um clima de insegurança em boa parte dessa área.
O pior é que a falta de fiscais em número suficiente é só um
dos problemas. Outro, igualmente grave, é a impunidade de fato existente nesse
setor, porque mesmo o trabalho precário feito pelos agentes é anulado pelo não
pagamento da quase totalidade das multas. Segundo o procurador Bruno Soares
Valente, do Ministério Público Federal do Pará, só 2% das multas aplicadas pelo
Ibama e pelo ICMBio são pagas. Assinale-se que o Pará é o Estado responsável
por 40% da área de 5.483 km² que foram desmatados em 2013 na Amazônia Legal.
Apesar desse quadro sombrio, há alguns dados animadores. O
primeiro é o poder dado ao Ibama de confiscar e leiloar bens apreendidos, como
madeira e máquinas usadas para o corte de árvores, o que tem ajudado a tornar
mais efetiva a sua ação. Outros são as parcerias entre órgãos federais
envolvidos na questão - que sempre deveriam ter existido, mas antes tarde do
que nunca - e o emprego de modernas tecnologias de vigilância.
As imagens dos satélites de monitoramento do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Cadastro Ambiental Rural permitem
localizar com maior precisão os predadores e planejar as ações contra eles.
Está sendo testado também um Veículo Aéreo Não Tripulado (drone), que produz
imagens ainda mais nítidas.
Tudo isso ajuda, mas não dispensa um aumento considerável do
número de fiscais e um esforço muito maior do que o feito até agora para evitar
que os infratores consigam driblar as multas. De pouco adiantará todo esse
aparato tecnológico, se os predadores continuarem a não pagar pelo que fazem.
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