BSPF - 10/04/2014
Embora o recurso diga respeito a servidores do Estado de São
Paulo, a decisão do Supremo Tribunal Federal afetará todos os servidores
públicos do Brasil
A sessão do Supremo Tribunal Federal, ocorrida na última
quarta-feira (02), foi iniciada com a apresentação do voto-vista da ministra
Cármen Lúcia, em recurso extraordinário com repercussão geral. A ministra
reconheceu o direito dos servidores públicos à indenização em face da omissão
do Estado em efetivar, mediante lei, revisão geral anual das remunerações.
A ministra lembrou que, desde 2001, o plenário da Suprema
Corte reconheceu a demora do Poder Executivo em efetivar a revisão geral anual,
mas afastou a tese da responsabilidade objetiva do poder público e do dever
deste indenizar os servidores em razão desta omissão de legislar.
No entanto, disse que a omissão legislativa do Estado, em
desatendimento a inovadora regra da Constituição da República de 1988 (art. 37,
X), que prevê a revisão geral anual dos servidores públicos, na mesma data e
sem distinção de índice, gera a responsabilização do Estado, mediante o dever
de indenizar, nos termos do § 6º do mesmo art. 37.
A ministra fez referência à jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal, que nestes casos tem aplicado a Súmula 339, que impede o
aumento de vencimento a título de isonomia. Mas afastou a incidência porque se
discute revisão geral anual, não aumento de remuneração. Disse que a apreciação
do caso pelo Poder Judiciário se impõe em razão da cláusula constitucional da
inafastabilidade da jurisdição.
O ministro Roberto Barroso, dizendo-se surpreendido com o
voto da ministra Cármen Lúcia, divergiu, negando provimento ao recurso. Não
vislumbrou dever específico do Estado de corrigir anualmente a remuneração dos
servidores públicos, menos ainda correspondente à inflação verificada. Disse
que o inciso X do art. 37 apenas impõe o dever do Estado de analisar a situação
remuneratória dos servidores e, se for o caso, promover a revisão, mas isso não
seria automático. Reconheceu que seria conveniente que assim fosse, mas não
haveria norma constitucional que impusesse o dever de revisão anual da
remuneração. Disse que a expressão “revisão geral anual” contida no inciso
mencionado apenas impõe o dever do Executivo manifestar-se, de forma
fundamentada, sobre a situação remuneratória dos servidores. Disse temer que o
reajuste automático acarretaria a indexação da economia, levando o país a
talvez reviver a hiperinflação.
O ministro Dias Toffoli lembrou que todos os contratos públicos,
inclusive de serviços públicos, preveem revisão anual, o que não retroalimenta
a ideia inflacionária.
O ministro Gilmar Mendes reconheceu que, por longos
períodos, os servidores ficam sem reajuste, que depois são compensados com
aumentos. O ministro Dias Toffoli replicou que o inciso X, na redação dada pela
Emenda Constitucional 19, de 1998, foi pactuada pelo Congresso Nacional. O
ministro Luiz Fux cogitou de modulação dos efeitos da inconstitucionalidade,
para ajustar um índice de reposição. O ministro Ricardo Lewandowski lembrou
ainda o princípio da irredutibilidade da remuneração, que estaria ofendido se
não reajustada anualmente as remunerações.
O ministro Teori Zavascki pediu vista, suspendendo-se o
julgamento.
Entenda o caso
Trata-se de recurso extraordinário contra acórdão do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, confirmou sentença e julgou
improcedente pretensão de policiais militares que queriam a condenação daquele
Estado ao pagamento de indenização que reponha a inflação que corria a
remuneração daqueles servidores.
Os recorrentes alegam violação do artigo 37, inciso X e §
6º, da Constituição da República, por entender ter incorrido o Poder Executivo
em omissão ao não encaminhar projeto de lei anual destinado a viabilizar reajuste
anual dos vencimentos dos servidores públicos estaduais.
O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de
repercussão geral da questão constitucional, em dezembro de 2007.
Em 2011, quando iniciado o julgamento do mérito, o voto do
ministro Marco Aurélio reconheceu o direito dos servidores serem indenizados
por não terem recebido revisão geral anual em seus vencimentos.
Agora, a ministra Cármen Lúcia apresentou seu voto,
acompanhando o ministro Marco Aurélio, seguido do voto divergente do ministro
Roberto Barroso e o pedido de vista do ministro Teori Zavascki.
Repercussão geral
Embora o recurso diga respeito a servidores do Estado de São
Paulo, a decisão do Supremo Tribunal Federal afetará todos os servidores
públicos do Brasil, especialmente os servidores federais, que desde 2003 não
têm reconhecido o direito a revisão geral anual de remuneração, em decorrência
de omissão legislativa. Milhares de ações individuais e coletivas pleiteiam o
mesmo direito reclamado neste processo.