Juliana Espanhol
Correio Braziliense
- 08/03/2015
Número de brasileiras em cargos de liderança no setor
público aumenta, mas elas ainda não conseguem alcançar posições com salário
superior. Contratações baseadas no mérito em vez do famoso "quem
indica" poderiam ajudar a reverter a situação
No Dia Internacional da Mulher, o Brasil tem pelo menos um
motivo para comemorar: entre os países do G-20, o país fica em 5º lugar em
quantidade de mulheres em funções de liderança no setor público, de acordo com
pesquisa da consultoria Ernst & Young (EY). Com 34% de participação
feminina nos postos de chefia, o Brasil só fica atrás do Canadá, da Austrália,
da África do Sul e do Reino Unido (veja quadro).
No entanto, quando se leva em conta a participação feminina no setor privado e no Congresso Nacional, o resultado brasileiro é bastante inferior: 5% e 9%, respectivamente, o que classifica o país em 15º e 19º lugares nesses quesitos. "Temos de quebrar paradigmas para conquistar mais representatividade feminina em todos os campos da sociedade brasileira. Faltam programas afirmativos", afirma Liliane Junqueira, líder de Governo e Setor Público da consultoria de negócios EY.
No entanto, quando se leva em conta a participação feminina no setor privado e no Congresso Nacional, o resultado brasileiro é bastante inferior: 5% e 9%, respectivamente, o que classifica o país em 15º e 19º lugares nesses quesitos. "Temos de quebrar paradigmas para conquistar mais representatividade feminina em todos os campos da sociedade brasileira. Faltam programas afirmativos", afirma Liliane Junqueira, líder de Governo e Setor Público da consultoria de negócios EY.
De acordo com pesquisa da Escola Nacional de Administração
Pública (Enap) sobre Servidores Públicos federais do Poder Executivo, a
participação de mulheres chegou a 46% em 2014, o que corresponde a mais de 248
mil trabalhadoras. Elas também são maioria em cargos de chefia, em percentuais
que vão de 59% a 54%, de acordo com o tipo de cargo ou gratificação.
"Houve evolução, no entanto há mais servidoras com ensino superior e
pós-graduação e isso não se reflete na distribuição das gratificações mais
altas", comenta o diretor de Comunicação e Pesquisa da Enap, Pedro Luiz
Cavalcante. Nos cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS) níveis 5 (R$
10.429,65) e 6 (R$ 12.972,50), os mais altos, o percentual de mulheres era de
apenas 28% e 19% em 2014.
Para a coordenadora-geral de Pesquisa da Enap, Marizaura
Camões, processos seletivos objetivos são fundamentais para aumentar o
equilíbrio. "A atribuição da maioria dos cargos de chefia é por indicação,
mas há experiências mais meritocráticas na administração pública, em que são
realizados processos seletivos", afirma. Outro fenômeno observado pela
pesquisa é a concentração feminina em áreas sociais. No Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome (MDS), por exemplo, o índice de chefes do sexo feminino
chega a 52%, enquanto, no Ministério da Defesa, a liderança de mulheres é de
apenas 15%. "Em parte, isso reflete escolhas profissionais, mas também é
influenciado pela cultura organizacional", afirma Pedro Luiz Cavalcante.
A distribuição se repete no comando de ministérios. Nesta
gestão da presidente Dilma, quatro das seis ministras estão em pastas sociais:
Desenvolvimento Social e Combate à Fome; Secretaria de Direitos Humanos;
Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e Secretaria de
Políticas para as Mulheres.
Movida a desafios
Servidora do Tribunal de Contas da União (TCU) há 15 anos,
Simone Barbosa, 49 anos, é também diretora de Integração Regional no Sindicato
dos Servidores do Poder Legislativo (Sindilegis). No TCU, ocupa o cargo de
oficial de gabinete do ministro Augusto Nardes. Antes disso, Simone chefiou
diversos setores do tribunal, como a gráfica, o cerimonial e a folha de
pagamento. "Sou movida a desafios e tenho facilidade para me adaptar a
mudanças", diz ela, que acredita que essas características foram importantes
para obter cargos de liderança. Simone admite que, muitas vezes, o gênero ainda
é um empecilho no ambiente de trabalho. "O grande desafio no serviço
público é se impor e ser respeitada. Já recebi várias cantadas... É preciso ser
segura e ter consciência da própria capacidade."
Competência
No Superior Tribunal de Justiça (STJ) há 25 anos, Sulamita
Marques, 48, é secretária de Orçamento e Finanças do órgão, à frente de uma
equipe de cerca de 50 pessoas. Formada
em direito e em contabilidade, Sulamita foi uma das primeiras de sua família a
ingressar no serviço público, assim como a completar o ensino superior.
"No setor privado, há diferença salarial para as mulheres e é mais difícil
ascender na carreira", avalia. Ao longo dos anos, Sulamita viu o número de
representantes femininas crescer em cargos de liderança no STJ. "Aqui, não
percebo discriminação. O critério é a competência, o que faz sentido, porque as
mulheres vêm se qualificando cada vez mais", diz. O estudo, assim como a
dedicação, são peças-chave para o sucesso profissional. "Se você se
atualiza, mostra que é determinada e tem capacidade, o reconhecimento é
natural."
Flexibilidade
Economista formada pela Universidade de Brasília (UnB),
Anamélia Seyffarth, 51 anos, é secretária executiva da Câmara de Comércio
Exterior (Camex) desde janeiro deste ano. Chefiando uma divisão com cerca de 40
funcionários, Anamélia é responsável por prestar assessoria direta ao ministro
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), Armando Monteiro
Neto. Na visão da servidora, planos de carreira bem estruturados e a adoção de
políticas, como creche no local de trabalho, são benéficos às mulheres.
"Uma progressão profissional mais lenta e meritocrática é melhor para as
mulheres, pois elas não precisam ter medo de perder um cargo muito alto
conquistado cedo demais."
Mãe de dois filhos, de 23 e 13 anos, ela passou por órgãos
com mais e menos suporte às mães. Na época em que a filha mais velha era
pequena, Anamélia morava no Rio de Janeiro e trabalhava na comissão de comércio
exterior do Ministério da Fazenda em um cargo comissionado. "Lá, havia
creche no próprio prédio, o que dá mais segurança e conforto. Quando meu
segundo filho nasceu, em Brasília, me mudei para mais perto do trabalho e,
assim, podia ficar com ele no almoço", conta. Ela destaca a flexibilidade
que encontrou no retorno da licença-maternidade. "Fui promovida pouco
tempo depois de voltar à Assessoria de Assuntos Internacionais da
Fazenda", relembra.
A força da mulher negra
Ministra aos 50
Nascida em Belo Horizonte, Nilma Lino Gomes, 50 anos,
assumiu o posto de ministra da Igualdade Racial em janeiro deste ano. Das salas
de aula do curso de pedagogia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),
chegou à reitoria da Universidade de Integração Internacional da Lusofonia
Afro-Brasileira (Unilab), situada em Redenção (CE) e foi a primeira mulher
negra a assumir tal cargo em uma universidade federal no país, em 2013. Com uma
carreira acadêmica marcada por estudos que envolvem tanto gênero quanto relações
étnico-raciais, a ministra ressalta a posição da negra nessa data comemorativa.
"No Dia Internacional da Mulher, acho importante destacar a força das afrodescendentes", observa. "A representatividade da negra em posições de liderança é pouco significativa perto do que somos quantitativamente na sociedade brasileira e perto da formação que possuímos", critica. A ministra ressalta que isso não se deve à falta de qualificação. "As políticas de promoção de igualdade racial têm conseguido colocar mais em evidência que nós podemos participar do mercado de trabalho, com mais qualificação", avalia.
"No Dia Internacional da Mulher, acho importante destacar a força das afrodescendentes", observa. "A representatividade da negra em posições de liderança é pouco significativa perto do que somos quantitativamente na sociedade brasileira e perto da formação que possuímos", critica. A ministra ressalta que isso não se deve à falta de qualificação. "As políticas de promoção de igualdade racial têm conseguido colocar mais em evidência que nós podemos participar do mercado de trabalho, com mais qualificação", avalia.