Vera Batista
Correio Braziliense
- 28/06/2015
O secretário de Relações do Trabalho do Ministério do
Planejamento aposta na racionalidade dos servidores do Executivo para que
aceitem o percentual de reajuste de 21,3% em quatro parcelas, até 2019. Segundo
Mendonça, a proposta é a única possível pela situação fiscal do país
Mesmo com a reação contrária do funcionalismo, o governo
está confiante de que, passado o primeiro momento, os servidores vão refletir e
entender que o país está em um momento difícil. "Acho que a nossa proposta
permite que o processo de negociação continue bem. Não há razão para
exarcebação do conflito ou para confronto", assinalou o secretário de
Relações do Trabalho do Ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça. Ele não
acredita que em 7 de julho haja uma aceitação completa sobre a proposta, mas
considera que o caminho para o entendimento está traçado.
Apesar de o índice de 21,3%, em quatro parcelas, até 2019,
ter desagradado à maioria das categorias, o peso desse aumento será
significativo nos cofres públicos. A folha de pagamento, apenas do Executivo
civil - excluídos os militares e os trabalhadores dos Poderes Judiciário e
Legislativo -, será de R$ 32,2 bilhões no período. Pelos cálculos do
Planejamento, em 2016, o gasto, que hoje é de R$ 151,5 bilhões, passaria para
R$ 159,8 bilhões. Em 2017, subiria para R$ 167,8 bilhões; em 2018, para R$
175,8 bilhões; e, em 2019, para R$ 183,7 bilhões.
"Estamos ignorando o crescimento da folha que vai
acontecer por concursos, por crescimento vegetativo e por eventuais
reestruturações de carreira que não passem pela mesa de negociação. Por isso, o
número poderá ser maior, em torno de R$ 35 bilhões até 2019", previu
Mendonça. Ele descartou a possibilidade, ao contrário do que afirmam as
lideranças sindicais, de queda do poder aquisitivo. "Insisto que os dados
que temos, desde a política iniciada em 2003, são muito superiores. Não apenas
empatamos com a inflação. A grande maioria, ou quase todas as categorias, teve
recuperações expressivas."
O secretário disse também que está otimista e não espera
greves ou movimentos exacerbados, mas, caso ocorram, o governo estará preparado
para lidar com os fatos, seja na conversa, seja na Justiça. Ele admitiu que o
ritmo dos concursos públicos está e continuará mais lento embora muitos
certames devam ocorrer até o fim do ano. Hoje, o Executivo federal tem 1,2
milhão de servidores - 600 mil na ativa. Com o avanço tecnológico, não será
mais preciso substituir cada pessoa que se aposentar por uma nova. "As
formas de gestão do trabalho hoje são muito diferentes", justificou.
A proposta de 21,3% de reajuste, em quatro anos, não agradou
aos servidores públicos federais, que esperavam 27,3% para já em 2016. Como o
sr. pretende lidar com essas resistências?
Primeiro, eu gostaria de esperar a reação oficial, formal,
dos sindicatos, em 7 de julho. Acho que os servidores, como todos os
trabalhadores, são pessoas racionais, olham para a realidade, para o contexto
em que estão vivendo. Em uma análise objetiva, equilibrada, vão ver que o
governo fez um esforço bastante razoável, diante da conjuntura econômica,
social, sistêmica e fiscal, especificamente, de apresentar uma proposta
coerente e consequente. Então, espero que essa análise possa levar as
lideranças a uma visão mais mais ponderada, por uma razão muito simples: o
contexto do setor público é diferente da conjuntura do setor privado. Isso tem
que ser levado em conta. Infelizmente, estamos passando por uma situação
adversa, as pessoas estão perdendo o emprego, e os salários estão caindo.
Os servidores alegam que a queda no poder aquisitivo é muito
grande, e que governo tentou passar uma borracha no passado, olhando somente
daqui para frente. Simplesmente esqueceu as perdas anteriores.
Posso garantir que, olhando um período mais longo, desde a
política que a gente faz a partir de 2003, não há perdas. Os sindicalistas
estão pegando um ponto que lhes interessa para justificar seus argumentos. Nós
podemos garantir que não há perdas.
Nos cálculos do Sindicato Nacional dos Servidores do Banco
Central (Sinal), entidade que criou o corrosômetro para medir o baque nos
subsídios, as perdas inflacionárias, que estavam em 20%, com essa política de
21,3%, ao fim de 2019, subirão para 22,8%.
Não sei que números estão sendo usados ou qual é a projeção.
Nós estamos calculando em cima da inflação de 2016 a 2019 que o mercado está
projetando. É evidente que cada ator, sindical ou não, pode projetar uma
inflação diferente dessa.
O senhor informou que os cálculos do governo foram com base
no Boletim Focus de 19 de junho de 2015. Nesse boletim, a inflação para 2015 de
8,97% não foi considerada?
De 2003 a 2005, os reajustes superam a inflação, incluindo a
de 2015. Os sindicatos pegam um ponto no tempo, que eu respeito, mas não
concordo. Mesmo incluindo os 8,8% - não 8,97% -, não houve perda para as categorias.
Inclusive os analistas do BC tiveram ganhos. Isso é fácil de provar.
Eles admitem que, do período Lula para cá, houve
recuperação. Mas os prejuízos significativos da época da política restritiva do
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não foram repostos. Esperavam que um
governo dos trabalhadores tivesse a "sensibilidade" de entender isso.
Insisto que os dados que temos, desde a política iniciada em
2003, são muito superiores. Não apenas empatamos com a inflação. A grande
maioria, ou quase todas as categorias, teve recuperação expressiva. Inclusive
daquele período citado. Há uma divergência de números. É uma questão de bater
número contra número. As entidades têm todo o direito de escolher um discurso,
a gente respeita a opinião delas, mas o governo tem seus elementos e vai
apresentá-los, também. Estamos bastante tranquilos com a política que foi feita
desde 2003.
O governo propôs 21,3%, que representam 5,5%, 5%, 4,8% e
4,5%, em 2016, 2017, 2018 e 2018, respectivamente. Até onde o governo pode ir?
Há possibilidade de mudança nesses números, diante do inconformismo dos
servidores?
Não, nesse momento, não. A princípio, trabalhamos, como
costumamos dizer em processo de negociação, com uma oferta final para o
reajuste salarial. Pode ter outros elementos relacionados a outros itens.
Porque essa é a parte central. O governo fez o esforço possível, dentro
situação fiscal e econômica como um todo. Essa primeira reação
(descontentamento dos servidores) é muito rápida. Acho que vai haver um
reconhecimento do esforço de preservar o poder aquisitivo até 2019. Mas, nesse
momento, a proposta do governo é essa. Vamos aguardar a contrapartida das
entidades para repensar qualquer outra discussão. Tem, além disso, o debate
sobre os benefícios.
Em números absolutos, quanto esse aumento vai onerar a folha
de pagamento?
Se aplicar o 21,3% sobre a folha do Executivo civil -
ativos, aposentados e pensionistas -, o aumento é de R$ 32,2 bilhões, em 2019.
Esse cálculo não inclui as Forças Armadas e os poderes Judiciário e
Legislativo.
Qual é o custo atual com a folha de pagamento do Executivo
civil?
A previsão, para 2015, é de R$ 151,5 bilhões.
Ao longo dos quatro anos, como vai ser o comportamento das
despesas com esse pessoal?
Em 2016, passaria para R$ 159,8 bilhões. Em 2017, subiria
para R$ 167,8 bilhões; em 2018, para R$ 175,8 bilhões; e, em 2019, para R$
183,7 bilhões. Estamos ignorando o crescimento da folha que vai acontecer por
concursos, por crescimento vegetativo e por eventuais reestruturações de
carreira que não passem pela mesa de negociação. Por isso, o número poderá ser
maior, em torno de R$ 35 bilhões até 2019.
Os servidores prometem muitos protestos contra o percentual
apresentado pelo governo, além de greves, entregas de cargo de chefia e outros
movimentos que podem ter impacto negativo no serviço público. Já existe um
plano de contingenciamento para evitar maiores danos à sociedade?
Evidentemente, nós esperamos que isso não aconteça. Eu
insisto, servidor, como qualquer trabalhador, é um ser racional. Não estou
falando dos dirigentes sindicais. Estou falando dos servidores da base. Claro
que os dirigentes sindicais tendem a representá-los. É para isso que os
sindicatos e as entidades servem, mas acho que os servidores estão olhando para
o Brasil de 2015, para a realidade do país e para tudo que foi feito lá atrás.
Sobretudo quem está há 12 anos no serviço público conhece a política feita por
esse governo. Acredito que nossa proposta é coerente, consequente, bastante
razoável, sobretudo para o trabalhador que tem estabilidade no emprego e não
corre risco de perder a vaga. O poder aquisitivo, para frente, nas nossas
contas, vai ser preservado. Pode ser até otimismo da minha parte, mas não
espero uma reação de greve, de paralisação.
Mas há um plano B?
A gente vai lidar com o que vier, como lidou nesses 12 anos.
É da natureza da relação do trabalho ter conflito. O governo vai ter que buscar
alternativas para eventuais paralisações, que a gente espera que não sejam generalizadas.
Ou seja, a rigor, não há plano B. É tradição lidar com conflito.
Vai ter judicialização dos possíveis conflitos, como ocorreu
em 2012?
É natural. A judicialização ocorre de parte a parte, do lado
das entidades sindicais e do Poder Executivo. Tudo depende da duração de um
eventual conflito. Se for curto, não há necessidade; se muito longo, talvez.
Não dá para prever o que acontecerá. Nós estamos em um processo de negociação,
vamos aguardar o o retorno das entidades.
A sua expectativa é de que, em 7 de julho, quando as partes
retornarem à mesa de negociação, haverá um acolhimento do índice?
Acho que a nossa proposta permite que o processo de
negociação continue bem. Não há razão para exarcebação do conflito ou para
confronto. Então, exatamente em 7 de julho, pode ser que não haja uma aceitação
completa. Mas a proposta cria condições para que a gente continue a negociar
positivamente.
E para os militares. O percentual vai ser o mesmo?
Essa conversa ainda vai existir dentro do governo. Há uma
discussão própria dos militares.
O senhor falou nos concursos que vão ocorrer. Eles
diminuíram muito este ano.
De fato, o ritmo está diferente por conta inclusive das
limitações de Orçamento, mas continuam sendo autorizados.
Qual seria o percentual de redução previsto, em relação a
2014?
Essa é uma decisão da Secretária de Gestão Pública (Segep),
mas ainda vão ser liberados muitos concursos daqui até dezembro. Vínhamos no
ritmo acelerado, para se ter uma ideia, nos últimos 12 anos de governo, tivemos
250 mil novos provimentos de servidores públicos. Uma média de 21 mil novos
servidores por ano. Essa velocidade, no entanto, nem é mais necessária. Porque
60% desses novos foram para a área de educação. Teve a ver com a expansão do
sistema federal de ensino. Tanto das universidade, mas, sobretudo, dos
institutos. Essa expansão está consolidada. Então, não há mais a mesma
urgência.
Alguns especialistas em concursos dizem que houve um boom de
certames na década de 1980, mas essas pessoas estão se aposentando.
Por isso, agora, mais do que nunca, a administração federal
precisaria de um reforço.
De fato, vai haver um ciclo de aposentadorias. Mas os
especialistas sabem também que as novas tecnologias diminuem muito a demanda de
pessoas. Nos anos 1980, se trabalhava com máquina datilográfica. Agora, com
internet, computador. Isso permite uma produtividade muitas vezes superior à do
passado, principalmente em atividades de escritório, de apoio.
Qual o total de servidores do Executivo civil?
Hoje, são 1,2 milhão de pessoas, mas apenas cerca de 600 mil
são ativas.
Com o avanço da tecnologia, ainda se precisa desses 600 mil?
Quantos serão necessários no futuro?
Isso depende muito do que se imagina que vai ser a expansão
futura das demandas da sociedade. Mesmo com avanço tecnológico nessas duas ou
três décadas, se for preciso abrir uma agência nova do INSS, ou um instituto
federal de ensino, não tem como fazer funcionar sem gente. Agora, quando as
pessoas que estão na área de apoio dos ministérios, das autarquias e fundações
se aposentam, não há necessidade de substituir uma que sai por uma que entra.
As formas de gestão do trabalho hoje são muito diferentes.
Qual vai ser a proporção entre os que saem e os que deverão
entrar?
Seria um chute apresentar um percentual, porque isso depende
de cada área.
Em relação ao Poder Judiciário, os índices de reajuste serão
os mesmos do Executivo? O ministro Nelson Barbosa enviou proposta semelhante ao
presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski.
O ministro foi ponderar com o presidente do Supremo que a
nossa proposta para o Executivo civil é de 21,3% e que os projetos (de reajuste
para o Judiciário) em tramitação são muito mais altos. Ele (Nelson Barbosa)
argumentou que, diante da situação que estamos vivendo, seria o caso de o
Judiciário considerar essa hipótese. Sempre respeitando a autonomia dos
poderes.
"Posso garantir que, olhando um período mais longo,
desde a política que a gente faz a partir de 2003, não há perdas. Os
sindicalistas estão pegando um ponto que lhes interessa para justificar seus
argumentos. Nós podemos garantir que não há perdas"
"Acho que os servidores, como todos os trabalhadores,
são pessoas racionais, olham para a realidade, para o contexto em que estão
vivendo. Em uma análise objetiva, equilibrada, vão ver que o governo fez um
esforço bastante razoável, diante da conjuntura econômica, social, sistêmica e
fiscal, especificamente, de apresentar uma proposta coerente e
consequente"