Robson Barbosa e Thaís Artmann
Consultor Jurídico
- 30/11/2015
Em 21 de outubro de 2015, a Comissão de Direitos Humanos e
Legislação Participativa do Senado Federal aprovou o parecer dado pelo relator
senador Paulo Paim ao Projeto de Lei 287/2013, que pretende regular o direito à
negociação coletiva e greve dos servidores públicos. Todavia, tal qual um
boomerang, ao passo em que traz consigo avanços em relação aos problemas
históricos da liberdade sindical no serviço público, também contém retrocessos
que anulam seus benefícios.
Para isso perceber, é importante relembrar que, com a
promulgação da Constituição da República de 1988, aos servidores públicos foi
permitida a associação sindical, contudo, vieram as controvérsias acerca do
exercício da greve e da negociação coletiva.
Isto porque a greve deveria ser exercida “nos limites
definidos em lei específica” que ainda não foi editada, mesmo após 27 anos da
sua previsão constitucional. Para amenizar essa omissão, o Supremo Tribunal
Federal, através dos Mandados de Injunção 670, 708 e 712, estendeu aos
servidores a disciplina da Lei 7.783/1989, originalmente aplicável às
paralisações da iniciativa privada, deixando a critério dos Tribunais a
conformação dessa norma às greves no serviço público, caso a caso, o que gera
certa insegurança jurídica acerca desses movimentos. Já sobre a negociação
coletiva, desde o julgamento pelo STF da ação direta de inconstitucionalidade
492, foi negada essa forma de diálogo institucionalizado para os servidores,
tornando a greve o único e gravoso veículo de expressão das suas
reivindicações.
O PLS 287/2013 visa sanar essas incongruências com a
garantia normativa da greve e da negociação para os servidores, contudo, mesmo
com pontos favoráveis, analisando-o na sua íntegra, não é possível afirmar que
a categoria teria muitos motivos para comemorar a sua aprovação.
A começar pelos pontos positivos, na proposta original do
PLS 287/2013, havia a figura da mesa de negociação coletiva em caráter
permanente, prevendo que as entidades de classe deveriam, até fevereiro de cada
ano, convocar assembleia-geral a fim de deliberar sobre as reivindicações da
categoria a serem defendidas durante o processo de negociação coletiva, o que
dava margem à interpretação de que somente uma vez por ano é que haveria a
obrigação de diálogo entre a administração e os servidores. Esse caráter foi
substituído pelo emergencial, o que gera dois benefícios aos servidores: a
institucionalização da negociação coletiva e a possibilidade de diálogo sempre
que necessário.
Também é benéfico o PLS 287/2013 quando repete a previsão constitucional
de que somente os militares das Forças Armadas não têm direito de realizar
greve, pois o efeito dessa exclusão consiste na decorrência lógica de que todos
os demais servidores podem utilizar dessa ferramenta, tornando ilegítima
qualquer declaração de ilegalidade em razão dos sujeitos que a exercem.
Mas os aspectos negativos do PLS 287/2013 iniciam quando não
prevê a obrigatoriedade da presença de uma autoridade com poder decisório para
negociar diretamente com os servidores, pois abre margem para processos de
“negociação de fachada”, vez que não estarão os servidores negociando com
alguém que possa atendê-los.
Não bastasse isso, o PLS 287/2013 autoriza que as
proposições apresentadas pela mesa de negociação sejam homologadas ou aditadas
pelo titular do respectivo poder, ou seja, após o processo de negociação, o que
restar acordado poderá ser unilateralmente alterado, o que não aconteceria se
na mesa de negociação houvesse alguém com poder decisório para validar, na
mesma oportunidade, os termos do acordo. Qual o efeito disso? Novas greves para
lutar pelas reivindicações que não foram atendidas em razão do tal
“aditamento”!
Ademais, o PLS 287/2013 afirma que os motivos e a
oportunidade da greve escolhidos pela categoria serão submetidos a juízo de
proporcionalidade e razoabilidade, o que pode retirar dela toda sua eficácia,
pois funciona em momentos inoportunos para a administração a forçar com que as
reivindicações sejam discutidas. Tal previsão também é inconstitucional porque
o juízo sobre a oportunidade da greve compete exclusivamente aos trabalhadores.
Por fim, é também prejudicial a previsão de que 70% dos
servidores lotados em um mesmo órgão ou unidade administrativa estão
autorizados a fazer greve, mantendo-se 30% restantes trabalhando, pois parte do
pressuposto de que os servidores e administração não são capazes de obter
consenso sobre qual a força de trabalho é necessária para cumprir com o mínimo
da continuidade dos serviços públicos, gerando dois outros problemas: órgãos
que precisam de mais servidores em atividade terão déficit na prestação de
serviços e órgãos quem podem manter a regularidade sem o encargo de um número
excessivo de servidores.
Esse quadro explica o efeito boomerang caso aprovado o PLS
287/2013 em seus atuais termos, pois avança em muitos pontos na mesma medida em
que retrocede, fazendo com que o que parecia ser a esperança da regulação de
direitos tão cruciais aos servidores se torne um novo problema, tudo com
reflexos negativos sobre a continuidade dos serviços públicos.
Robson Barbosa é advogado do Cassel Ruzzarin Santos
Rodrigues Advogados
Thaís Artmann é estagiária do Cassel Ruzzarin Santos
Rodrigues Advogados