BSPF - 15/02/2017
Reajustes obtidos judicialmente por servidores públicos
devem ser absorvidos em caso de mudança do regime remuneratório por lei
posterior.
Conforme dispõe a Constituição Federal, a remuneração dos
servidores públicos só pode ser reajustada, ou fixada, caso seja criado novo
cargo, mediante a edição de lei específica. Assim como ocorre com os
trabalhadores da iniciativa privada, ao funcionalismo público é assegurada a
irredutibilidade de vencimentos. Portanto, falar em reajuste significa,
necessariamente, falar em aumento da remuneração.
Todavia, apesar do comando legal, nem sempre tais reajustes
são concedidos ou aplicados de maneira correta pela Administração. Seja em
decorrência de imprecisões legislativas, seja em virtude de regulamentações
internas que acabam por restringir os direitos dos servidores, muitos destes
acabam tendo de recorrer ao Judiciário para assegurar a devida aplicação do
reajuste.
É importante destacar, entretanto, que o pedido judicial de
concessão do reajuste não pode ser pautado exclusivamente no princípio da isonomia,
nos termos da Súmula Vinculante nº 37, do Supremo Tribunal Federal. Faz-se
necessária, portanto, a existência de uma lei específica que conceda o
reajuste, mas que tenha sido aplicada de modo incorreto pela Administração.
Ao fim do processo, havendo decisão judicial favorável, o
reajuste passa a integrar a remuneração do servidor. Do mesmo modo, é devido o
pagamento retroativo do reajuste, sobre o período em que este deveria ter sido
pago, mas não o foi, excluindo-se apenas parcelas eventualmente prescritas.
Mais comumente do que se imagina, a Administração Pública,
sempre mediante a edição de lei, reestrutura seus quadros funcionais, com vista
a obter maior eficiência na realização de suas tarefas. Assim, criam-se novos
cargos, com novos padrões remuneratórios, ou simplesmente alteram-se cargos
existentes, também havendo consequências na remuneração do servidor. O que
acontece, então, com os reajustes concedidos judicialmente, em face das novas
determinações legais?
A resposta para essa questão pode ser encontrada no artigo
6º da Lei nº. 13.317, de 20 de julho de 2016, que estabelece a absorção da
Vantagem Pecuniária Individual (VPI) e de parcelas dela decorrentes, concedidas
por decisão judicial ou administrativa, para os cargos afetados pelo referido
diploma legal.
A VPI foi instituída pela Lei nº 10.698, de 3 de julho de
2003, e resultou no reajuste de R$ 59,87 (cinquenta e nove reais e oitenta e
sete centavos), concedido a todos os servidores da União. Contudo, este aumento
configurou revisão geral anual, uma vez que concedida a todos os servidores, na
mesma data, em lei de iniciativa do presidente da República. Ao contrário do
mandamento constitucional, o índice concedido não foi o mesmo para todos os
cargos.
Essa violação ao instituto jurídico da revisão geral anual
motivou diversas entidades sindicais e inúmeros servidores a irem ao Judiciário
para que fosse aplicado índice idêntico, de 13,23% a todos os servidores. Tal
pleito, inclusive, vem sendo acolhido pelo Superior Tribunal de Justiça, a
partir do julgamento do REsp nº 1.536.597 – DF.
Aplicando-se o citado artigo 6º, portanto, temos a absorção
do reajuste concedido aos servidores em âmbito judicial, mesmo com a alteração
da estrutura remuneratória promovida pela Lei nº 13.317/16. Trata-se, dessa
forma, de reconhecimento e correção de erro cometido pela Administração,
mantendo os reajustes concedidos pelo Judiciário aos servidores, após a correta
interpretação dos dispositivos legais.
Merece destaque, ainda, o parágrafo único do referido artigo
6º, que estabelece a concessão de parcela complementar de natureza provisória,
que será gradativamente absorvida, para servidores que passem a receber
vencimentos inferiores aos percebidos antes da edição da Lei nº 13.317/16, em
decorrência da reestruturação por esta produzida.
Trata-se de norma jurídica de rara felicidade no Direito
Administrativo brasileiro, marcado por diversas confusões e impropriedades
técnicas em âmbito legislativo, o que dificulta sobremaneira a correta
aplicação de seus institutos jurídicos. A situação trazida pelo artigo 6º, e
parágrafo único, da Lei nº 13.317/16, deveria ser tomado como regra geral para
casos semelhantes, inclusive com o intuito de trazer certa uniformidade aos
órgãos da União.
Tomando por base estes dispositivos, entendemos que os
reajustes concedidos em âmbito judicial devem ser absorvidos na hipótese de
mudança de regime remuneratório decorrente de lei posterior, inclusive como
meio de reconhecer a luta dos servidores para a garantia de seus direitos, bem
como para assegurar a irredutibilidade de seus vencimentos — direito
constitucionalmente assegurado à categoria.
Lucas de Oliveira, advogado especialista em Direito do
Servidor Público, no escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados.
Fonte: Blog do Servidor