BSPF - 22/07/2017
O Ministério do Planejamento não cumpriu o acordo assinado
desde 2016 com o “carreirão” do Poder Executivo de incorporar as gratificações
nas aposentadorias. Mas, no demonstrativo de agosto, os servidores poderão ter
uma boa surpresa
O dinheiro já deveria ter entrado nos contracheques desde
janeiro. Agora, o governo terá de pagar os retroativos. A justificativa para
anexar os valores do adicional foi porque o ganho mensal desse pessoal (80% do
funcionalismo) é composto por vencimento básico (VB) e gratificações. Essa
divisão provoca uma perda de 50% na remuneração, quando se aposentam, pelo fato
de só levarem para a inatividade uma parte (o VB) do que recebiam, apesar de a
vida inteira terem contribuído à previdência com 11% sobre o total dos
salários. O aumento previsto nas despesas para esse ano é em torno de R$ 300
milhões.
A incorporação das gratificações, segundo analistas, pode
agravar ainda mais o rombo no regime próprio dos servidores da União (RPPS),
que no ano passado teve uma queda de 2,5%, em relação a 2015, conforme dados do
Tesouro Nacional. Em 2016, o governo desembolsou R$ R$ 230,7 bilhões para
financiar o déficit do RPPS e do RGPS (Regime Geral de Previdência Social, dos
trabalhadores da iniciativa privada). Desse total, R$ 77,1 bilhões se referem a
servidores públicos civis e militares. “Sem discutir o mérito, creio que a
iniciativa chegou na hora o menos apropriada possível. O governo precisa com
urgência frear os gastos. Essa expansão das despesas é incompreensível”,
analisou José Matias-Pereira, especialista em contas públicas da Universidade
de Brasília (UnB).
Para Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central,
a equipe econômica do presidente Michel Temer deveria rechaçar “as armadilhas”
nas negociações salariais, principalmente aquelas acordadas pela gestão
anterior. “As promessas do passado não se enquadram no presente. Se o dinheiro
está curto, não tem porquê dar aumento de salários, muito menos ampliar despesas
obrigatórias como a da Previdência”, reforçou Freitas. Para Sérgio Ronaldo da
Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço
Público Federal (Condsef), o acordo tem que ser cumprido, porque “a luta para
corrigir essa injusta e absurda perda vem de décadas”, lembrou.
“O direito é indiscutível. É bom lembrar que, entre todas as
categorias do serviço público, os que ganham menos contribuíam mais para a
previdência. Pagávamos sobre o total e recebíamos a metade”, assinalou o
secretário-geral da Condsef. Além disso, lembrou Silva, o desembolso com a
incorporação, em torno de R$ 300 milhões, já está previsto no orçamento de
2017. De acordo com o Planejamento, a “expectativa é de que esses pagamentos
ocorram já na próxima folha (agosto/2017) a depender da homologação das novas
funcionalidades no Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos
(Siape)”. Ao contrário da Confederação, o ministério, que concordou por escrito
com a medida, ainda não tem ideia do tamanho do aumento das despesas.
O carreirão, de acordo com o Planejamento, recebe salários
entre R$ 2,7 mil e R$ 8,9 mil mensais. Os servidores de nível auxiliar têm
salário inicial de R$ 2.765,39 e final de R$ 3.123,14. No nível intermediário,
os ganhos vão de R$ 3.414,97 a R$ 4.514,23. E os que têm nível superior recebem
de R$ 5.035,29 a R$ 8.924,74. “Como o impacto em folha depende da aplicação das
regras de cálculo implantadas no Sistema Siape e considerando-se o volume de
aposentados na administração pública federal, somente após o processamento da
folha de agosto de 2017 é que serão validadas essas despesas”, informou o
Planejamento, por meio de nota.
Beneficiados
O pagamento, com a soma do adicional, vai beneficiar cerca
de 730 mil pessoas (315 mil aposentados, 115 mil, em abono permanência, e mais
300 mil vestirão em breve o pijama), nos cálculos da Condsef. Pela lei,
publicada no ano passado, os servidores incorporariam 67% das gratificações em
janeiro de 2017, 82%, em janeiro de 2018, e, finalmente, os 100%, em janeiro de
2019. Para ter direito ao dinheiro, o servidor teve que assinar um documento
concordando com a junção. “O governo vem adiando o pagamento da primeira
parcela dos que já assinaram termo de opção”, reclamou Sérgio Ronaldo da Silva.
Ele informou, ainda, que o ministério garantiu que, caso não
haja tempo hábil para a inclusão dos recursos na folha deste mês, o pagamento
será assegurado para o mês subsequente, no início de setembro. “Segundo o
Planejamento, os acertos técnicos já foram finalizados”, reforçou. O atraso de
oito meses está incomodando grande parte dos trabalhadores que aguardam a
concretização do pacto feito na campanha salarial de 2015. No início do mês
passado, a Associação Nacional dos Servidores da Previdência e da Seguridade
Social (Anasps) denunciou que, pela segunda vez, o ministério postergou.
“Causa estranheza que, após tanto tempo, o argumento
continue sendo as dificuldades de conclusão do sistema de processamento que
liberaria os pagamentos”, criticou Paulo César Regis de Souza, vice-presidente
executivo da Anasps. Segundo ele, a cada mês, a frustração dos servidores
aumenta. Tanto dos que “querem ver para crer” antes de vestirem o pijama,
quanto dos que continuarão nos afazeres do dia a dia. “Informações não oficiais
apontam que 13 mil servidores do INSS estão recebendo abono de permanência em
serviço. Completaram tempo para a aposentadoria e aguardam a incorporação da
Gratificação de Desempenho de Atividades do Seguro Social (GDASS)”, apontou.
Com a saída desse pessoal, quem continuar ficará sobrecarregado,
na análise de Regis de Souza. “O INSS tem necessidade urgente de 15 mil
servidores para reposição e manutenção de suas 1.600 unidades em todo o país,
muitas delas operando com remoto, isto é, servidores de agências próximas que
se deslocam para atendimento”, contou. Ele lembrou, ainda, que os pedidos de
concursos foram descartados. Um certame para mil servidores foi feito há dois
anos, mas apenas 400 aprovados foram convocados.
Na Polícia Federal, a situação é semelhante. O sonho de
incorporação da Gratificação de Desempenho de Atividade Técnico-Administrativa
(GDATPF) ainda não se realizou. Éder Fernando da Silva, presidente do Sindicato
Nacional dos Servidores do Plano Especial de Cargos da Polícia Federal
(SinpecPF), recebeu do Planejamento a mesma resposta padrão. “Não foi
finalizada a operacionalização do Siape”. A classe teve ainda mais um problema
que o levou Sindicato a buscar o Judiciário. Segundo ele, há 2.784 ativos e
1.352 administrativos aposentados na PF.
Desses, cerca da metade, que se aposentou antes de 2006,
ficaria de fora da incorporação da GDATPF, porque não teve condições de cumprir
a regra que exigia o acúmulo de 60 avaliações de desempenho. “Tivemos que
entrar na Justiça para explicar que, se o servidor não fez avaliação, a culpa
não foi dele. Foi da administração não tinha os instrumentos e não criou os
critérios”, assinalou Silva. Segundo ele, não contemplar todos seria uma
discriminação. Na PF, com o anúncio da reforma da Previdência e pelo temor da
perda de direitos adquiridos, muitos servidores anteciparam sua saída, apesar
da escassez de mão de obra disponível, concluiu Éder Fernando da Silva.