Isabella Souto
Correio Braziliense
- 10/02/2014
Projeto que cria 25 exceções no limite de R$ 29.462,25 de
rendimentos no funcionalismo...
Uma proposta feita sob medida para agradar aos Servidores
Públicos - e talvez desafiar o Tribunal de Contas da União (TCU) e o governo
federal- está na lista de temas a serem analisados pelo Congresso neste ano.
Mesmo com pouco tempo disponível para votações, já que, como apontou o Correio
na edição de ontem, o ano legislativo será mais curto, os parlamentares têm na
manga um texto que vai facilitar a proliferação de supersalários na Esplanada
e, de quebra, atrair votos de muitas categorias e ainda confrontar órgãos
fiscalizadores. Em 2013, o TCU ganhou uma briga na Justiça para que benefícios
como hora extra não servissem para o cálculo do teto constitucional, hoje de R$
29.462,25, e obrigou o Senado a devolver o que foi pago a mais nos últimos
cinco anos.
No fim do ano, entretanto, no apagar das luzes e sem alarde, os congressistas aprovaram um projeto que cria 25 exceções na contagem do teto - as chamadas parcelas indenizatórias que não seriam consideradas parte do salário e que, na prática, vão inflar contracheques sem que precisem ser abatidos. E gasto extra é tudo de que o governo não quer ouvir falar.
No fim do ano, entretanto, no apagar das luzes e sem alarde, os congressistas aprovaram um projeto que cria 25 exceções na contagem do teto - as chamadas parcelas indenizatórias que não seriam consideradas parte do salário e que, na prática, vão inflar contracheques sem que precisem ser abatidos. E gasto extra é tudo de que o governo não quer ouvir falar.
A matéria foi aprovada na Comissão de Regulamentação de
Dispositivos Constitucionais - composta por deputados e senadores - em novembro
do ano passado, em menos de cinco minutos e sem que alguém tenha se manifestado
verbalmente contra ou a favor. O texto regulamenta o artigo 37 da Constituição
Federal, que exclui da aplicação do teto as parcelas de caráter indenizatório e
diz que uma legislação específica trataria dos casos - o que até hoje não foi
feito. Atualmente, a Resolução 14 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é a
única norma que elencou exceções à aplicação do teto para servidores do
Judiciário, como diárias de viagem, verba para mudança e transporte e auxílios
moradia e alimentação.
Os parlamentares, porém, foram além, e incluíram outras
verbas, como o auxílio-doença, auxílio-acidente, auxílio-natalidade,
ressarcimento de despesas médicas e odontológicas, salário-família e até o
auxílio-fardamento - verba destinada aos militares para o custeio da farda. Na
justificativa do projeto, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), autor da primeira
versão do texto, admite que o tema é "controverso" e que deve ser
observado sob dois ângulos.
"Moralidade"
O primeiro é que, "a bem da moralidade pública", é
preciso haver um limite fixo para o pagamento a servidores. "De outro
lado, a política remuneratória deve ser tal que respeite a complexidade e a
responsabilidade das atribuições dos agentes públicos, além de atentar para a
necessidade de atrair profissionais que sejam, ao mesmo tempo, talentosos e
vocacionados para atuar no Estado, submetendo-se a todas as restrições que lhes
são inerentes", argumenta.
Um dos objetivos da proposta é garantir no próprio Congresso
e em outros órgãos a presença de altos servidores que, além de terem funções
comissionadas, praticamente seguram o andamento das atividades parlamentares,
como diretores, secretários e chefes de gabinete. O salário dos parlamentares
em si não seria modificado com a regra, pois as regalias a que eles têm
direito, como auxílio-moradia e verba indenizatória, já não são contabilizadas
como remuneração. Na prática, a medida pode estender aos funcionários públicos
parte dos direitos dos congressistas.
Além das 25 parcelas elencadas na matéria, ainda há um
inciso que abre brechas para a inclusão posterior de outros benefícios. Isso
porque o inciso diz que poderão surgir outras "parcelas indenizatórias
previstas em leis específicas". O relator do projeto, senador Romero Jucá
(PMDB-RR), alega que o trecho foi colocado porque o projeto não tem a pretensão
de ser uma "lista exaustiva" de todas as modalidades de verbas
indenizatórias existentes.
Após passar pela comissão, o projeto chegou à Mesa Diretora
da Câmara dos Deputados em 10 de dezembro do ano passado e já foi para o
plenário. O texto, porém, entra na lista dos demais que podem não andar neste
ano por conta da morosidade do Congresso devido à Copa e às eleições. O Correio
apontou ontem que haverá apenas 52 dias com possível votação em 2014. Mas, a
depender da motivação política, a pressa pode ser amiga da aprovação de
determinados temas, que beneficiem, de alguma forma, os próprios parlamentares,
direta ou indiretamente.
Entenda o caso
Liminares contra a reforma
Aprovada em dezembro de 2003, a reforma da Previdência criou
o teto salarial a ser aplicado no serviço público. Pouco depois, foram milhares
as ações judiciais de servidores com contracheque com valores superiores - em
todas elas, alegando o princípio do direito adquirido para não sofrer cortes no
bolso. Os tribunais de Justiça concederam várias liminares acatando a tese, mas
elas logo foram derrubadas pelo STF, que determinou o abate-teto nos altos
salários. Ficou então a dúvida: benefícios e adicionais conquistados ao longo
de uma carreira estariam assegurados? Penduricalhos recebidos por ocupantes de
cargos eletivos seriam contabilizados no cálculo do teto?
As respostas começaram a vir em 2006, durante o julgamento
do Mandado de Segurança 24.875, ajuizado dois anos antes por quatro
ex-ministros do STF: Djaci Alves Falcão, Francisco Manoel Xavier de
Albuquerque, Luiz Rafael Mayer e Oscar Dias Corrêa. Eles pediram a declaração
de inconstitucionalidade de dois artigos da emenda constitucional que tratou da
reforma da Previdência e incluíram as vantagens pessoais e o adicional por
tempo de serviço no cômputo do teto dos Servidores Públicos. Também queriam o
reconhecimento de violação ao chamado direito adquirido.
Durante a sessão de julgamento, os ministros entenderam que
é constitucional a limitação do vencimento do Servidor Público - ou seja, não
adiantaria argumentar a tese do direito adquirido para impedir um corte no
salário. Por unanimidade, os magistrados decidiram ainda que os valores pagos
referentes a adicionais por tempo de serviço (biênios, quinquênios e
trintenário) devem ser incluídos no cálculo do subsídio para efeito de teto.
As vantagens pessoais foram motivo de divergência entre os
ministros. Pelo apertado placar de 6 votos a 5, venceu a tese que as vantagens
pessoais deveriam ser mantidas sobre o argumento da irredutibilidade dos
vencimentos. Faltou então, a aprovação pelo Congresso Nacional de uma
legislação estabelecendo quais são as verbas indenizatórias que estariam de
fora da aplicação do teto.
Colaborou Adriana Caitano