Servidor Legal
- 22/08/2014
A alteração das atribuições de cargos pela Administração
Pública é matéria frequente no âmbito jurídico. Isso porque, não raro, a
Administração faz alterações em confronto com as determinações legalmente
permitidas.
Por exemplo, em relação aos servidores federais, a definição
de cargo público deriva do artigo 3º da Lei 8.112/90:
Art. 3o Cargo público
é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura
organizacional que devem ser cometidas a um servidor.
Parágrafo único. Os
cargos públicos, acessíveis a todos os brasileiros, são criados por lei, com
denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em
caráter efetivo ou em comissão.
Veja-se, as atribuições de um cargo estão previstas
previamente ao concurso público específico para cada cargo, que além disso, são
criadas por lei. E, uma vez criadas por lei, somente são passíveis de
alterações, também, por lei.
É sabido que os servidores públicos não possuem direito
adquirido ao regime jurídico, entretanto, tal premissa não autoriza a
Administração alterar, unilateralmente, por norma incompetente, as atribuições
dos cargos, sob pena de ilegalidade.
Assim o é porque a Constituição Federal, no artigo 37,
incido II, dispõe que a investidura em cargo ou emprego público depende de
prévia aprovação em concurso público, de acordo com a natureza e complexidade
do cargo ou emprego.
Além disso, alterações extremadas de atribuições de cargos
importam em provimento derivado, espécie de ingresso no serviço público vedada
pela Constituição. Tenha-se que provimento derivado é entendido como aquele em
que o servidor ingressa num plexo de atribuições distinto do qual foi nomeado,
sem que prestasse o concurso público específico daquele ao qual investe-se.
Ou, ainda, importa, no mínimo, em desvio de função do
servidor.
A matéria administrativo-constitucional não permite que o
servidor venha exercer funções distintas daquelas que caracterizam o cargo para
o qual prestou concurso público. Nas palavras de Carmén Lúcia:
“Com o início do exercício nascem para o servidor todos os
direitos que a lei lhe assegura nessa condição, inclusive o desempenhar as
funções inerentes ao cargo para o qual foi nomeado, cumprindo-se o quanto posto
legalmente. Nomeado para determinado cargo e nele investido, há de exercer o
servidor, a partir de então, as funções a ele inerentes e a nenhum outro.
E tanto assim é porque as funções são definidas para cada
cargo público de tal maneira que elas corresponder ao conjunto de atribuições
conferidas à responsabilidade do agente que titula.
Surge, pois, quanto ao exercício um dos mais gravosos e
comuns problemas da Administração Pública, que é o desvio de função,
acarretando traumas administrativos nem sempre facilmente solúveis.
Dá-se o denominado “desvio de função” quando o servidor é
nomeado e investido em um cargo público e passa a desempenhar funções inerentes
a outrem, mediante ato e o designa para tanto, sem qualquer comportamento
formal. (Princípios constitucionais, 1999, p. 232-234)
O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou sobre a questão
afirmando que somente quando houver similitude de funções desempenhadas não
haveria a ofensa ao artigo 37, inciso II da Constituição Federal – Princípio do
Concurso Público, ou seja, quando houver mudança de atribuições de um cargo por
lei formal e competente para tanto, além de mantidas as similitudes de funções
(e.g. MS 26955).
O que significa que não é permitido à Administração Pública
realizar alterações substanciais nas atribuições dos cargos.
Além disso, a Lei 8.112/90, que rege os servidores públicos,
em seu artigo 13, veda expressamente a alteração unilateral das atribuições.
Atitude diversa, impondo atribuições funcionais em que nada se relacionam com
as anteriormente exercidas, corresponde à violação da segurança jurídica do
servidor, que ficará vulnerável ao ditames conforme conveniência da
Administração Pública.
Para além da ilegalidade do ato, que não a lei formal
própria para modificações de competências, impor ao servidor função diversa da
qual prestou concurso específico, acarreta, invariavelmente, em desvio de
função.
Assim, conclui-se que somente é permitido à Administração
Pública promover alteração de atribuições em cargos públicos através de lei
própria (quando assim fixadas por lei), mas além disso, desde que preserve as
similitudes de funções, que não importem em desvio de função, bem como em
violações à segurança jurídica dos servidores e ao Princípio do concurso
público. Desatenção à esses requisitos, qualquer alteração será ilegal e
inconstitucional.